A Aldeia Numaboa ancestral ainda está disponível para visitação. É a versão mais antiga da Aldeia que eu não quis simplesmente descartar depois de mais de 10 milhões de pageviews. Como diz a Sirley, nossa cozinheira e filósofa de plantão: "Misericórdia, ai que dó!"

Se você tiver curiosidade, o endereço é numaboa.net.br.

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Afogando as mágoas

Qui

11

Jun

2009


22:00

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Eu nem lembro quantos anos ainda tinha, mas era bem piá. E a gente tava numa canoa, com um professor acompanhando, mas a gurizada deu a louca e resolveu virar o barquinho pra zoar. Todo mundo foi pra água, gritando e festando. Eu não, porque não fui a favor da zoeira, não sabia nadar direito e a lagoa tinha lá uns três metros de profundidade. Mas me virei, sabia manter a cabeça pra fora d'água. Por pouco tempo, até que um dos guris, que não sabia nadar, desesperado se jogou em cima de mim, subiu por sobre os meus ombros pra tentar se salvar, e eu só lembro de estar engolindo água de repente, impotente diante do susto, vendo a superfície luminosa do lago ficando cada vez mais longe lá pra cima, desespero total.

A sensação de que vou morrer durou pouco porque um professor logo tirou o piá de cima de mim e levou nós dois para uma árvore submersa que tinha alguns galhos na superfície, e lá a gente ficou até alguém tirar a gente da lagoa. Sujeito firme aquele. Mas o susto foi impactante e marcou pra vida toda.

Uma coisa que me chama a atenção é saber que o guri não fez por mal, mas quase me matou por seu desespero de tentar se salvar. E quantas vezes não fiz isso por aí, e quantas vezes não sofri disso de novo? Não no lago nem com barco virado, mas ao longo dessa caminhada tantas e tantas vezes se fere por conta de se defender, tantas vezes até de coisas que nem existem, mas que parecem tão ameaçadoras quanto não encontrar lugar pra colocar o pé quando se está na água. E quando alguém se vê ameaçado e pode subir por cima de alguém pra se salvar, acredite que vai fazer isso se não enxergar nenhum outro caminho. E assim se segue ferindo e sendo ferido.

Faz parte da maturidade estar preparado para nadar. Faz parte da maturidade sair de baixo quando alguém que não sabe nadar tenta usá-lo como bóia. Às vezes é possível salvar o desesperado, às vezes, infelizmente, não. Mas faz parte da maturidade não se desesperar nem se deixar afogar pelo desesperado.

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